segunda-feira, 21 de março de 2016

Outono!







Ruínas

Se é sempre Outono o rir das primaveras,
Castelos, um a um, deixa-os cair…
Que a vida é um constante derruir
De palácios do Reino das Quimeras!
E deixa sobre as ruínas crescer heras.
Deixa-as beijar as pedras e florir!
Que a vida é um contínuo destruir
De palácios do Reino de Quimeras!
Deixa tombar meus rútilos castelos!
Tenho ainda mais sonhos para erguê-los
Mais altos do que as águias pelo ar!
Sonhos que tombam! Derrocada louca!
São como os beijos duma linda boca!
Sonhos!… Deixa-os tombar… deixa-os tombar…
Florbela Espanca
Retirado do site:https://cdeassis.wordpress.com/tag/fernando-pessoa/


quinta-feira, 3 de março de 2016

Cinco mal-entendidos




A lojinha de velhos vinis e CDs era larga mas atravancada, abafada, de teto baixo. Prateleiras e balcões cheios de velharias. Aqui e acolá, uma preciosidade. Uma mocinha bonita começou a passar lá de vez em quando, aparentemente quando saía do escritório para almoçar. Ficava mexendo nos vinis de jazz. Lauro, o dono da loja, fantasiou nela uma intelectual que lia poesia em inglês e sabia escolher vinhos. Um dia ela foi para o balcão de axé e lá se deteve. Ele não resistiu e foi perguntar se ela gostava daquilo. “Não,” disse a moça, “é que hoje o ventilador está virado pra cá.”

Paulo Jatobá, sertanejo, soldador, 47 anos, irrompeu furibundo num bar e fuzilou com cinco tiros seu vizinho Nestor Sá, 61 anos, aposentado, conhecido como Nestor Merdinha, o qual havia entreouvido numa conversa doméstica a esposa recente do dito Paulo, Marilinha da Silva, 20 anos, afirmar que era virgem, e saiu depreciando tanto o caráter da madame quanto a virilidade do esposo, por não ter entendido que se tratava meramente de uma comparação zodiacal entre donas-de-casa ociosas.

O pai leva o filho a um evento de mangás, RPGs, quadrinhos, com dezenas de estandes, milhares de pessoas, numa balbúrdia indescritível. A certa altura o garoto volta para junto dele, puxa sua camisa, excitado: “Pai, me dá cinco e cinquenta!”. Ele dá uma nota de dez, manda guardar o troco, volta a conversar com os amigos. Daí a pouco olha e vê o garoto num estande afastado, com expressão arrasada, quase chorando. Vai até lá e vê a vendedora segurando um álbum imenso, quase 500 páginas, e explicando ao guri: “São cento e cinquenta...”

A piriguete, em plena viagem turística acompanhando turnê da banda de forró Abaixa Que Eu Levanto, entra no hotel, pega a chave na recepção, sai batendo com os saltos altos no piso, rebolando dentro do shortinho. Entra no elevador, fala com autoridade para o ascensorista gordo e cinquentão: “Vamos para o quarto, por favor.” Ele responde: “Pois não, senhora. Em que andar fica?...”


César estava recebendo duas primas distantes, irmãs, que vieram passar férias com os pais dele. Mesmo tímido, levou as duas a um filme bem mulherzinha, depois a um terraço à beira mar para tomar cerveja e pendurar a conta até onde a vista desse. Apaixonou-se de imediato por uma delas. A certa altura (a música era ensurdecedora) criou coragem, aproximou-se do ouvido da outra e gritou: “Diga a sua irmã que ela é muito linda!”. Ela, também gritando: “O quêee?” Ele: “Muito liiinda!”. Ela deu um sorriso brejeiro, correu os dedos sobre o decote, ergueu os olhos para ele sem mexer a cabeça e disse: “Esperei tanto por isto...”

Mundo Fantasmo - Bráulio tavares


http://mundofantasmo.blogspot.com.br/2016/02/4057-cinco-mal-entendidos-2322016.html
SEGUNDA-FEIRA, 22 DE FEVEREIRO DE 2016

4057) Cinco mal-entendidos (23.2.2016)