domingo, 19 de maio de 2013

O PRIMEIRO "NÃO" A GENTE NÃO ESQUECE

 


"Prezado senhor...devolvemos-lhe seus originais...desejamos-lhe muito sucesso..."
O primeiro “não” que recebi de uma editora foi em 1991, há quase 20 anos. Não era bem uma editora, e sim o Laboratório de Produção Editorial da Escola de Comunicação da UFRJ, a Eco. Minha pequena história de humor, “Superávit, o herói brasileiro”, tinha feito algum sucesso com alunos, professores e o próprio diretor da escola a recomendara para publicação (chegou até a sair no “Ecos da Praia Vermelha”!). No entanto, a obra não passou pelo crivo dos alunos de produção editorial, que a rejeitaram, com argumentos que contestei, mas que não adiantou nada. Acabaram publicando uma espécie de manual de redação e lá se foi o sonho do primeiro livro.
Mas eis que logo em seguida um professor de publicidade da própria Eco adorou o livro e quis publicá-lo na sua editora, em Ipanema. Acharam que o ideal seria transformá-lo em história em quadrinhos. O diretor de criação ficou bem empolgado com as possibilidades de imagem e eu com a chance de me tornar escritor antes de me formar em jornalismo. Até que se deu a tragédia. O governo lançou um dos muitos planos econômicos ´milagrosos´ que surgiam na época da alta inflação, se não me engano foi o Plano Bresser, e lá foi tudo de novo por ´água abaixo´. Foi aí que tive o primeiro contato com o ´jargão oficial´ da recusa de um livro, algo do tipo “teremos que reduzir investimentos”, “mas desejamos-lhe muito boa sorte”, “quem sabe um dia possamos trabalhar juntos” etc.
A partir daí, começou a minha coleção de cartas de recusa de editoras, pois só mesmo quando se é jovem demais dá para acreditar que algum editor vá perder tempo analisando páginas datilografas em um envelope pardo (eram os anos 90) de um sujeito completamente desconhecido e sem qualquer tipo de indicação. Neste último item, até consegui um bom aval de dois respeitáveis professores da Eco, Muniz Sodré e Ana Arruda Callado, que gostaram muito do Superávit, mas mesmo assim nada.
Hoje conheço alguns editores que até avaliam autores desconhecidos, mas são raríssimos, além do quê os blogs são ferramentas muito mais úteis para a divulgação da turma que está escrevendo. Mas na época, era complicado...
Cito agora alguns trechos da lista de recusas utilizadas não só para o Superávit, mas também para outros textos. Acho que vale como um estudo de como era a dura vida de ´autores iniciantes´ na era pré-internet.
· 15/3/91 – Prezado André Luis:
“Fazemos referência ao título acima, cujos originais nos foram encaminhados para apreciação.
Lamentavelmente este texto não teve o “aceite” da nossa Comissão editorial e, em vista disso, não poderemos incluí-lo em nossa programação.
Cordialmente, ......”
· 24/10/91 – “Prezado André:
Lemos seu original e estamos devolvendo-o, por não se enquadrar em nosso projeto editorial.
Atenciosamente.”
· 30/10/91 – “Prezado Senhor,
Após cuidadosa análise, chegamos à conclusão que, infelizmente, seu original não se enquadra em nossos planos editoriais para um futuro próximo. Pedimos ainda desculpas pela morosidade da devolução, causada pelo enorme volume de originais a serem analizados (sic). Desejando-lhe sorte com seu novo livro, despeço-me.
Atenciosamene, ......”
· 16/3/93 “Prezado Sr,
Informamos que o original em referência não teve sua publicação recomendada dentro das prioridades de edição para o biênio 93/94.
Sendo assim, nós o estamos devolvendo, em anexo, a fim de liberá-lo para possíveis contatos com outros editores.
Atenciosamente, ......”
· 19/5/95 – “Prezado André:
Estamos devolvendo seu original, que, avaliado, não foi aprovado para publicação. Atenciosamente, ......”
· 15/5/98 – “Prezado senhor,
Agradecendo a atenção demonstrada ao procurar esta editora, lamentamos informar que nos encontramos impossibilitados de incluir os originais de sua autoria em nossa programação em curso.
Atenciosamente, ......”
· 22/6/99 - “Muito nos honrou sua preferência pela ...... para a avaliação de seu material original. Estamos porém com nosso planejamento editorial já definido para os próximos 24 meses, por isso informamos que no momento sua proposta enviada para análise não foi aprovada para ser incluída em nossa projeção de lançamentos.
Ficamos muito gratos por sua atenção e permanecemos interessados em discutir novos projetos.
Agradecemos mais uma vez seu contato,
Atenciosamente, ......”
Claro, nem tudo são espinhos. Recebi também alguns retornos positivos, mas que não tiveram seguimento por outros motivos. E, depois de muito tempo, consegui publicar, por enquanto, dois livros, “Manual do Serrote”, em 2004 (Ed. Bruxedo, editores Suzana D´Ávila e Luis Antônio), e “O Velho Oeste Carioca”, em 2008 (ed. Ibis Libris, editores Thereza Christina e João José de Melo Franco). Neste último caso, vale citar que já foi na época do meu blog e a Thereza, sem nunca ter ido à zona oeste do Rio, apostou no livro apenas com a leitura dos artigos que escrevia sobre a região.
Portanto, acho que vale a pena insistir, afinal, se depois destas cartas (e de outras que não quis incluir para não ficar muito extenso) eu segui em frente, uma recusa aqui e outra ali não vai fazer mal a ninguém. Na pior das hipóteses, serve para preencher um artigo de blog.

 

André Luis Mansur (*)

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N. E.: O autor tem diversos livros publicados, inclusive sua próxima obra "Fragmentos do Rio Antigo" será lançada daqui a alguns dias, no Rio.

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