sexta-feira, 30 de março de 2012

AS SEIS CADEIRAS

 

 

            Estou sentada no mesmo lugar, ou seja, na minha cadeira de pensar que, na verdade, é uma poltrona. Sinto-me como se aguardasse algo que não sei do que se trata, mas que é importante. Estou certa de que o inusitado está por acontecer.
            À frente uma extensa mesa, com uma jarra de porcelana ao centro, seis cadeiras vazias e uma paz diferente invadindo o lugar.
            Por uma porta lateral, uma pessoa adentra, vestida de uma túnica acetinada, um capuz que esconde os cabelos e parte do rosto, não me permitindo, num relance, identificar o seu sexo.
            Caminha alguns passos, surge a segunda, a terceira até o número fechar em seis, todas portando roupas semelhantes, porém exibindo nuances de azul do mais escuro ao mais leve. Tomaram seus assentos à mesa, sem titubeios, como se o lugar de cada uma estivesse previamente demarcado. Não se entreolharam e não abriram a boca.
            O que se sentara na primeira cadeira à direita estendeu o braço e me entregou um objeto. Era um caleidoscópio . A cada movimento, imagens e lembranças pululavam em minha mente, como se brotassem de cada faceta. Lembrei-me de um semblante firme, traços definidos, um sorrir discreto. Senti a presença de um amor que foi devotado à esposa paralítica até o último dia de vida, aos filhos a quem orientou e disciplinou no bem. Homem avançado para sua época, inteligente, fez da medicina alternativa o método natural para tratar seus filhos e criá-los com saúde. Amoroso, sem ser efusivo, politizado, integralista por convicção, meu avô paterno me visitou naquele presente.
            Em seguida, a segunda pessoa me entregou uma pirâmide, refletindo em cada face uma cor diferente: fixei-me nos reflexos que se enfeixavam rapidamente. Projetou em mim a imagem de um rosto sereno, olhar cândido e feliz de quem muito amou e se fez amar. Um coração que acolheu e amou a estranhos e lhes devolveu a dignidade como seres humanos. Senti de perto a velha paciência que suportou uma cadeira-cama de rodas, sem queixas e sem gemidos, outrora tão ativa e lúcida, minha avó paterna.
            A terceira veio trazendo uma estrela. Entre um cintilar e outro, senti a presença de um espírito forte, guerreiro, sofredor, mas não vencido. Capaz de narrar um acontecimento passado em sua vida, com cores atuais, repetidas vezes, sem, porém se repetir. Entre as palavras, gargalhadas sacudiam-lhe o corpo pequeno, como se a vida não lhe tivera aberto tantas feridas. Ressaltou-se a força de sua paixão pelo esposo, meu avô materno, que atravessou e venceu o tempo e as tempestades da vida.
            O quarto presente era um dado. Cada ponto negro, à medida que era manuseado, irradiava uma alegria, como a de viver sem igual, que ele carregou até que sua amada faleceu, indo-se ele pouco depois. Um solo de violão, como o que ele tocava, invadiu os ouvidos da alma. Vi seus dedos que feriam as cordas com paixão e destreza e ouvi sua voz que irrompia da abertura central do instrumento, como a oferecer à companheira, o seu melhor. Meu avô materno era leve de sentimentos e como uma pluma pousou no meu coração.
            Os que se haviam manifestado até aquele momento mantinham-se silentes em seus respectivos lugares, como se orassem a Deus, naquele instante tão irreal, como o sonho jamais conseguiria ser.
            Da quinta cadeira alguém se adiantou, portando uma bússola. A cada passo em minha direção, o ponteiro oscilava freneticamente entre os pólos, como se fossem desprender com o movimento, espargindo cores e perfumes, que se sucediam entre o adocicado, o amadeirado e o cítrico. Revi mais que um par de verdes olhos, mas um olhar esperto, especulativo, intenso, capaz de perceber além das evidências e perscrutar mistérios muito além das aparências. O perfume vinha do amor que ela nutriu pelos seus, pelo próximo e em prol dos mais fracos, o amor que ela muitas vezes dissimulou invadiu a todos naquele momento e nos sentimos melhor. Ao norte e ao sul, enxerguei folhas e flores em profusão, como as que ela amava e cuidava; oscilando entre o leste e oeste, senti o calor das chamas do conhecimento que ela buscou tardiamente nos livros e nos estudos, minha progenitora.
            Os outros cinco se deram as mãos enquanto esperavam a oferenda do último mensageiro. Naquela penumbra, não identificara nenhum rosto; sob as luzes intensas, muito menos, mas nada disso interessava. Eis que se aproxima alguém empunhando uma lanterna. Os raios multicores pareciam bailar, como um facho que acompanha um bailarino. Percebi que era o brilho da honradez, da honestidade, da firmeza do caráter desse que foi exemplo de retidão que o acompanhou até o leito de morte. Vislumbrei gestos firmes, decididos, ouvi palavras como a indicar e corrigir passos e de compreensão. Meu coração de filha o reconheceu e reverenciou cada gesto que emanava de sua lembrança.
            Quando quis dizer algo, se levantaram de repente e saíram cabisbaixos, conforme entraram e nada pude perguntar.
            Uma voz gritou meu nome, ao mesmo tempo em que me sacudia para que eu acordasse. Meu filho chegara da rua e me encontrou dormindo naquela poltrona. Esfreguei os olhos para certificar-me onde estava, sem entender o que acontecera. A única novidade eram seis rosas da jarra de porcelana que perfumavam a sala que, segundo meu marido, alguém deixara na porta da sala, sem nenhuma mensagem e sem qualquer identificação. Foi um presente inesquecível para mim, neste dia...

Dora Tavares

quinta-feira, 29 de março de 2012

A morte de Millôr Fernandes e suas frases maravilhosas...

Nota de falecimento: Millôr Fernandes (dia 27).

Morreu na noite dessa terça-feira, dia 27, no Rio de Janeiro, o escritor carioca Millôr Fernandes. Ele tinha 87 anos e teve falência múltipla de órgãos em sua casa. 
Segundo o jornalista da Band Ricardo Boechat, que conversou com o filho de Millôr, Ivan Fernandes, o corpo do escritor permanecerá hoje em uma funerária e será velado nesta quinta-feira, dia 29, a partir das 10h, no cemitério Memorial do Carmo, no Caju, zona portuária da capital. Em seguida, às 15 h, o corpo será cremado.

Veja imagens da trajetória de Millôr Fernandes

Em 2011, o escritor foi internado duas vezes na Casa de Saúde São José, também no Rio, mas os motivos da internação não foram divulgados.
Em entrevista ao canal GloboNews na manhã de hoje, o jornalista Zuenir Ventura lamentou a morte do amigo. "É realmente uma perda. A perda de um gênio. É uma perda para o jornalismo, para o teatro, para a literatura, porque o Millôr fazia tudo", afirmou.

Talento multifacetado

Além de escritor, Millôr também foi desenhista, jornalista e dramaturgo de destaque.
Nascido em 27 de maio de 1924 - segundo sua certidão de nascimento, mas a família diverge sobre o registro da data correta - o escritor ficou órfão de pai um ano depois e aos dez anos perdeu a mãe. Com pouca idade, viu sua família se separar e cada irmão teve de ir morar com um parente.
"Morto meu pai. Nessa idade a orfandade passa impressentida. Mas a família - mãe com quatro filhos - cai de nível imediatamente", escreveu o jornalista na biografia apresentada por seu site oficial.
"Morta minha mãe. Sozinho no mundo tive a sensação da injustiça da vida e concluí que Deus em absoluto não existia. Mas o sentimento foi de paz, que durou para sempre, com relação à religião: a paz da descrença", acrescentou ainda sobre as perdas. 
Aos 14 anos, entrou na carreira jornalística e aos 19, na revista "O Cruzeiro", que viu em seis anos sua tiragem subir de 11 mil para 750 mil exemplares, tornando-se uma grande influência na formação da opinião pública no Brasil.
Em 1957, aos 33 anos, expôs seus primeiros desenhos no Museu de Arte Moderna.
Millôr também for um dos criadores do jornal "O Pif-Paf" que, apesar de ter durado apenas oito edições, é considerado o ínicio da imprensa alternativa no Brasil. Colaborou ainda ativamente com "O Pasquim", publicação de forte oposição ao regime militar.
O escritor ainda traduziu várias peças de Shakespeare, tornando-se referência no meio teatral. Também colaborou em jornais como "O Globo" e "O Estado de S. Paulo", além da revista "Veja".
Na virada do século, lançou seu site oficial "Millôr Online". Mesmo com a avançada idade, foi sempre ligado a internet, às redes sociais, e possuía conta no Twitter com mais de 360 mil seguidores.


Frases:

  1. As pessoas que falam muito, mentem sempre, porque acabam esgotando seu estoque de verdades.
  2. Como são admiráveis as pessoas que nós não conhecemos bem.
  3. A verdadeira amizade é aquela que nos permite falar, ao amigo, de todos os seus defeitos e de todas as nossas qualidades.
  4. Certas coisas só são amargas se a gente as engole.
  5. Viver é desenhar sem borracha.

Literatura

Poesia

 Temática lua: Paulo Leminski

Prosa

Depoimento: Dora Tavares

Site de Leila Míccolis

Nova coluna no Yubliss: "Uma coruja pousou em minha tese" -- se comentar, assine

Abaixo-assinado para criação de hospitais veterinários públicos, assine e divulgue

quarta-feira, 28 de março de 2012

venham poemas

 

venham, poemas, líricos, idos, tidos
desusados
venham das gavetas das estantes do passado
venham a mim
todos
esquecidos não lidos poemas das bibliotecas
em milhares em milhões de seus versos
suas muitas vozes muitas rimas e
imagens
eu os amo, poemas perdidos
eu os amo
e poderia lê-los todos
se me dessem tempo de vida
todos
me esperam em fila nas bibliotecas velhas
nos seus esquifes-livros
finalmente fechados
quem os lerá?
quem saberá?
venham a mim, venham
de todas as partes
em todas as línguas
com todas as suas finas rimas

                                        Rogel Samuel

segunda-feira, 26 de março de 2012

E...Rubens da Cunha

livro com maçaneta

Falecimento de Roland Barthes (1980, Paris/França)

Frases da semana

"A verdade existe. Só a mentira pode ser inventada" - George Braque

"Nunca perguntarão ao vitorioso se ele contou a verdade"
"Quanto maior a mentira, maior a chance de todos acreditarem nela" - Hitler

"Há momentos em que calar é mentir” - Miguel de Unamuno

Biblioteca Virtual Blocos

Espaço de divulgação de livros e jornais que recebemos pelo Correio

Literatura

Poesia

Temática mensal poetas/poesia: Rogel Samuel

 

A palavra palavra

Nada existe fora da linguagem. Usamos a linguagem para explicar, entender, descrever, sentir. De uma forma ou de outra tudo sempre acaba se tornando palavra. É nosso jeito de estar no mundo, de ser o mundo.

A palavra “palavra” vem do grego parabolé, transformada no latim em parábola. Aquela mesma tão comum aos cristãos, já que Jesus falou muito através delas. A palavra acompanha a humanidade desde sempre, são milhares em cada idioma, vão se perdendo, se transformando, nascendo e renascendo enquanto o idioma estiver vivo. Normalmente não damos muita atenção às palavras, não percebemos que elas são feitas de dois elementos: o significante e o significado. Este último é, obviamente, o que a palavra quer dizer, o que ela significa, já o significante é o seu som ou como ela é “desenhada” sobre o papel. É justamente nesse ponto que não prestamos muito atenção: na beleza ou na feiura das palavras distanciadas de seu significado. Por exemplo, “aspereza” não tem um significado muito interessante, mas sonoramente e graficamente é belíssima, totalmente equilibrada, tanto no som quanto na escrita. E assim acontece com milhares de palavras, basta abrir o dicionário e se deliciar com lesim, ordálio, rezingar, trelência, palavras cujos significados escondem-se pelo pouco uso, mas com significantes que podem nos lançar em lugares que só a imaginação pode levar. A poesia faz muito isso: retirar a palavra de seu lugar comum e lançá-la no mundo vasto da metáfora.

Mas palavras não são apenas essas unidades gráficas e sonoras que podem ser vistas isoladamente, poeticamente. É com a palavra que sustentamos sistemas, religiões, fanatismos, amores, democracias, justiças e injustiças. A palavra está na base das artes, não apenas da literatura, mas está também nos pequenos gestos: é com a palavra que ferimos, salvamos, afagamos ou ofendemos, amamos, perdemos e ganhamos. A palavra não é algo que a gente apossa, a palavra não nos pertence como um objeto ou uma escolha, nós somos palavras, nosso pensamento é palavra, nós não temos uma linguagem, nós somos uma linguagem. Até mesmo Deus é palavra, tanto como já anunciado nos belos versos do apóstolo João (1,1): “no começo a Palavra já existia: a palavra estava voltada para Deus, e a palavra era Deus,” quanto na crença ou descrença: argumentos contra ou favor da Sua existência acontecem pela palavra. Não há escapatória.

Estamos tão imiscuídos com a linguagem que esquecemos muitas vezes de olhá-la com um pouco mais de carinho, de perceber sua força mas também a sua fragilidade, de perceber seus meandros, seus caminhos e descaminhos. Muitas vezes usamos a expressão: “faltam-me palavras”, não acredito que possam faltar palavras, talvez falte memória, leitura, poder de concisão ou descrição, mas palavras nunca faltarão. Pode haver um número finito delas no mundo, se contarmos as palavras de cada idioma na terra, uma hora vai acabar, mas o que nunca acabará é a capacidade humana de inventar, de criar, de desdobrar cada palavra em outras. Enquanto tivermos essa habilidade nos manteremos mais do que seres humanos, seres palavras...

domingo, 25 de março de 2012

Itinerário de uma viagem à Alemanha

 

alemanha

Bruxelas, 26 de agosto de 1856
Caro filho e irmãos do meu coração,

          O mês de agosto, que (sabem vocês) é tão funesto à minha felicidade, pela tríplice perda que imprimiu em minha existência, começou este ano mais triste e doloroso do que nunca. O coração confrangido, o espírito sempre abtido pela dilacerante recordação da morte da melhor das mães, eu via aproximar-se o primeiro aniversário do dia que a roubou à minha ternura.
          Vocês haviam pensado que Paris exerceria em mim sua costumeira magia. Pois bem, revi-a com indiferença; tornou-se-me monótona e quase insuportável, à medida que o triste aniversário se avizinhava. O abalo cruel que sacudiu todo o meu ser moral mantém-me ainda incapaz de apreciar, como outrora, a vida intelectual de que se frui nesta Atenas moderna.
          Era-me necessário percorrer novos países, nele haurir novas impressões, sob um horizonte mais amplo, em atmosfera mais livre e, conseqüentemente, mais consentâneas com minhas preferências. Importava-me, enfim, ver uma terra-tipo, cujo aspecto sério e respeitável se impusesse a meu espírito pela riqueza de sua natureza, pelo passado grandioso e pelos costumes ainda patriarcais de seu povo. Vocês vêem naturalmente que me decidi pela velha e poética Germânia, a digna pátria de Leibniz e Kant.
          Propondo-me realizar uma perigrinação ao túmulo de venerável amigo, o sábio e bom Duvernoy, preferi entrar na Alemanha pela Bélgica e sair por Kehl, para ir de Estrasburgo a Montbéliard, onde ele quis ser enterrado e onde sua virtuosa viúva me espera para, após minha viagem à Alemanha, retornar comigo a Paris. Sinto que as emoções dessa visita lutuosa, misturadas às que este triste mês me fez experimentar, me teriam incapacitado de ir além.
          Pelas oito horas da manhã, anteontem, 24 de agosto, fechei minha correspondência do Havre para vocês e, entregando a casa à ciada, tomei, com minha filha, uma carruagem que nos conduziu à estrada de ferro do Norte, verdadeira Babilônia de viajantes indo e vindo de todas as direções da França e do exterior.
          Enquanto eu pagava os bilhetes e cuidava da bagagem, estavas lá, diante de mim, ó filho dileto, tu que te encarregavas outrora dessas tarefas, quando eu tinha a felicidade de viajar com mais dois filhos. Agora, minha diligência substituía a tua, que me envaidecia tanto, quando te contemplava desembaraçado, sério e altivo como um jovem do Norte. Desta tua atividade eu esperava sempre melhores dias para tua mãe...
           O sinal de partida arrancou-me de meus pensamentos. Apresso-me em tomar nossos lugares e, um instante depois, o trem voava sobre os trilhos, deixando apenas o tempo suficiente para contemplar as paisagens que se sucediam, ainda sem interesse, sob nossos olhos.
          Já haviam desaparecido atrpas de nós Amiens, depois Arras, com suas reminiscências históricas, a primeira exibe seus canais, fábricas e linda catedral, a segunda evoca o fantasma ainda vivo de Robespierre. Em Valenciennes, paramos mais demoradamente para jantar e ver melhor a velha cidade em que Clóvis III e Carlos Magno realizaram, em 603 e 771, assembléias gerais.
          O percurso de Paris a Valenciennes pareceu-me monótono e triste, certamente por causa da disposição de espírito em que me encontrava. A imagem adorada da minha mãe seguia-me na mesma velocidade em que eu rapidamente percorria novos países, em qualquer parte do mundo, ou no silêncio do meu apartamento. Em Paris, ajoelhada diante de seu retrato, rezara durantes alguns instantes, e meus últimos pensamentos haviam sido dirigidos a ela e a vocês. A prece foi íntima e ardorosa. Senti no coração que minha mãe aprovava a viagem. Quando desci em Valenciennes, sua sombra me indicou a catedral e me precedeu lá.
          Depois de ter ezado por ela, fomos ver o hôtel de ville, as fortificações e a cidade construída por Vauban. A cidade é muito triste, e o mau tempo contribuiu ainda mais para torná-la assim a meus olhos.
          Na direção da fronteira belga, o campo mudou um pouco de aspecto e começou a me agradar mais. A pouca distância de Blanc-Misseron, última estação francesa, e setenta e duas léguas de Paris, atravessamos o limite que separa do solo francês o território belga.
          Chegando a uiévrain, primeira estação belga, submetemo-nos às corriqueiras formalidades aduaneiras. A fisionomia do interior das casas começa aqui a mostrar-se diversa: o poêle substitui, geralmente, à cheminée da França, e um ar de limpeza reina por toda a parte.
          Como na Inglaterra e em Portugal, experimentei emoções novas, tocando o solo de outro país que não a França; vocês sabem, eu sempre preferi esta nação a qualquer outra depois da nossa.
          Mudamos de viatura para tomar um trem belga, cujos lugares de primeira classe são tão bonitos e cômodos como os da França. As cidades, burgos, aldeias, paisagens, toda essa natureza mais ou menos bela, desdobrando-se rapidamente ante meus olhos, lembrava-me os rápidos momentos de minha felicidade, que infelizmente se esvaíram, pobre de mim! apenas eu começava a apreciá-los.
          Contemplando essas cenas variadas das paisagens que percorria, esforçava-me por mergulhar o espírito no seu passado histórico, a fim de desviar a tristeza que me roía mais vivamente o coração, nesse 25 de agosto.
          Alí esta Boussu, vila louçã, com o castelo que serviu de estada ao jovem Luís XIV, em 1655, quando comandou o cerco de Saint-Ghislain, que caiu em seu poder; aqui, Jemmapes, vaidosa de suas ricas hulheiras, a lembrar a célebre batalha que os franceses, comandados pelo General Dumouriez, ganharam contra o exército austríaco; por toda parte, à minha direita e à esquerda, sucedem-se paisagens interessantes, desenrolando-me uma página dos tempos passados. [...]
          Hoje, caros amigos, escrevo-lhes de Bruxelas, onde desembarquei com minha filha, pelas cinco horas, no cais do Sul. Uma pequena viatura, denominada aqui "vigilante", levou-nos ao Hotel da Rússia, onde nos encontramos instalados em belo e confortável quarto.
          Passou, portanto, o vinte e cinco de agosto! Sinto agora que, deixando-nos atordoar pelo silvo gritante do vapor em grande rapidez e pelos pequenos embaraços da bagagem, desendo aqui e ali, nas diversas estações, para percorrer às pressas uma cidade ou uma aldeia diferente, podemos desafiar melhor esta legião de tristes lembranças, fundeadas mais cruelmente em nosso coração, no aniversário da morte de meu ente adorado!...
          Sinto-me fatigada, e muito! Mas essa lassidão me é salutar. É às custas do físico que o moral talvez ressuscite. O corpo ficou inerte durante muito tempo, durante os combates do espírito e os pensamentos do coração! Agora é preciso que ele se agite, e muito, para ver se poderá restaurar esses dois poderes tão profundamente abalados em mim. Terei sucesso? Vê-lo-emos. Pelo menos vocês tomarão conhecimento dos esforços de minha vontade, para conservar uma existência que lhes é cara. [...]
          Mas é a propósito de Bruxelas que agora quero entreter vocês. Não pudemos julgar esta cidade, com base na parte que percorremos do embocadouro até aqui: este trecho é pouco limpo, ocupado pelo comércio da cidade baixa. Assim, se tivéssemos continuado nossa caminhada passando de um cais a outro, não teríamos conhecido o que há de mais belo e notável em Bruxelas, esta cidade, galantemente ataviada em torno de graciosos bulevares e belos edifícios, é edificada, em parte, sobre uma colina elevada e, em parte, em uma rica campina, atravessada pelos vários braços do Sena, rio pequeno em comparação com os nossos. [...]
          A limpeza das ruas e do exterior das casas logo me deu uma imagem positiva, principalmente logo que percorremos uma parte da cidade alta: as ruas são regulares, ornadas de ricas lojas, lindas casas e belos hotéis. As praças públicas e os passeios cheios de gente, algumas pessoas exibindo muito luxo e elegância, compõem a fisionomia de uma verdadeira capital da Europa.
          Empregamos uma parte do dia visitando os museus de Pintura e História Natural, bem como o Palácio da Justiça. Os primeiros encontram-se no Palácio das Belas-Artes, mais geralmente conhecido pelo nome de "Museu". stá situado ao lado de um Palácio utilizado nas exposições dos produtos de indústria nacional. Nesse momento, há uma muito importante.
          O vestíbulo por onde se entra no Palácio das Belas-Artes tem a forma de rotunda. Notável estátua de Hércules acha-se colocada ao pé da grande escada. Os gabinetes de Física e as ricas coleções de História Natural são de grande importância, assim como os quadros e as esculturas. [...].
          O Palácio da indústria engloba rica coleção de modelos de toda espécie, máquinas e instrumentos. Um dos lados é ocupado pela biblioteca real que possui (disseram-me) 200.000 volumes impressos e quase outro tanto de manuscritos; estes últimos sofreram, como todas as coisas da Europa, as mudanças dos vencedores, desde o Marechal de Saxe e Dumouriez, até Napoleão I, que restituiu uma parte.
          O Hôtel de Ville atraiu bem mais nossa atenção. É um velho edifício que oferece, ainda, apesar das devastações sofridas, uma parte de sua antiga magnificência. Entre as salas suntuosas, a graciosa mulher que no-las mostrava destacou aquela onde os antigos estados de Brabante tinham suas assembléias. Distingue-se pela riqueza e lembranças históricas. Mostraram-nos as chaves douradas, apresentadas a Napoleão quando de sua entrada em Bruxelas, cuja visão suscitará em todo viajante filosófo idéias sérias sobre o nada da grandeza humana. [...]

Nísia Floresta Brasileira Augusta

Do livro: Escritoras Brasileiras do Século XIX, vol. 1, 2ª ed., org. Zahidé Lupinacci Muzart, Editora Mulheres, 2000, EDUNISC/SC

sábado, 24 de março de 2012

24 de março de 1905: Morre Julio Verne, o pai da ficção moderna

24/03/2012 - 00:00 | Enviado por: Lucyanne Mano

Morre Julio Verne. Jornal do Brasil: Sábado, 25 de março de 1905.

"Traz-nos o telégrafo a notícia de que faleceu em Amiens o conhecido romancista Julio Verne. Quem há dentre nós que não deva ao imaginoso escritor muitas horas de sonhos e maravilhas?
Trazendo no espírito o amor do desconhecido e das aventuras arrejadas, todavia limitou-se a efetua-las, dentro das paredes do seu gabinetes, na calma e no isolamento dos sonhadores
".

Julio Verne nasceu na cidade francesa de Nantes. Iniciou estudos de Direito em Paris, mas desistiu de ser advogado para escrever peças teatrais. Apesar de ter produzido algumas obras como Amizade Perdida(1850), como dramaturgo, o sucesso só chegaria treze anos depois. A publicação de Cinco Semanas num Balão (1863) seria o início de seu êxito como romancista de aventuras. A obra, primeira da série Voyages Extraordinaires, apresentava o relato de uma viagem aérea sobre regiões desconhecidas da África Central. Nos anos seguintes, lançaria Viagem ao Centro da Terra (1864), Da Terra à Lua (1865) e Vinte Mil Léguas Submarinas (1870). O apogeu viria com A Volta ao Mundo em Oitenta Dias (1873), obra considerada a mais importante de sua carreira.
Além de habitar o imaginário infanto-juvenil de várias gerações, a literatura de Julio Verne é até hoje amplamente revisitada no cinema, no teatro e na televisão.

A volta ao mundo em 80 dias
Em A Volta ao Mundo em 80 Dias, encontramos, ao mesmo tempo, muito da breve experiência de Verne como marinheiro e como corretor de Bolsa. No ano de 1872, Phileas Fogg, membro do Reform Club de Londres, homem metódico e singular, propõe uma aposta comprometendo-se a dar a volta ao mundo em 80 dias. Tarefa quase impossível para a época, dá início a viagem, acompanhado de um fiel subordinado. Seguido por um detective da polícia, que o considera um ladrão, o protagonista vive mil e uma aventuras até chegar pontualmente ao seu destino, vencendo a aposta.

sexta-feira, 23 de março de 2012

Adeus a Chico Anysio, o humor versátil que veio de Maranguape

 

Chico Anysio por, CPDoc JB

Chico Anysio, 80 anos, estava internado desde o dia 22 de dezembro, após uma infecção no aparelho digestivo. Posteriormente diagnosticado também com pneumonia, em 14 de janeiro foi submetido a uma laparotomia exploradora, e durante o procedimento, retirou-se um segmento do intestino delgado para exames. Desde então, permaneceu em tratamento até falecer nesta sexta-feira, 23 de março de 2012, em decorrência de falência múltipla de órgãos, chegando ao fim a luta do humorista pela vida.
Casado seis vezes, Chico deixa viúva a empresária Malga de Paula, oito filhos, uma filha e nove netos.

Chico Anysio no dia da Primeira Comunhão. Reprodução

O cearense de Maranguape Francisco Anísio de Oliveira Paula Filho nasceu no dia 12 de abril de 1931. Na família, todo mundo o chamava de Oliveirinha. Por causa do pai. Coube ao seu talento consagrá-lo simplesmente como Chico Anysio.
Caçula por sete anos (até a chegada de Zelito), dizia nunca ter tido nenhum privilégio especial por isso. Era levado, e conforme as regras da época, apanhou muito. Mas nada que o desanimasse. Ainda na infância, quando mudou com a família para o Rio de Janeiro, Chico já ensaiava os primeiros passos da promissora carreira que trilharia ao longo da vida. Naqueles tempos em que a meninada soltava balão, pipa e jogava botão, ele ia além... Imitava pessoas do convívio cotidiano com boa dose de humor. Escrevia pequenas peças, distribuía os papéis dos personagens entre os irmãos e reunia parentes e vizinhos para dar o espetáculo.
Na adolescência, conseguiu a primeira oportunidade artística: aos 16 anos, foi empregado numa rádio, como humorista e comentarista esportivo. Mas foi na televisão, a partir de 1968, que se popularizou a frente de programas de humor em que escreveu e interpretou seus próprios personagens - ao todo mais de 200 tipos cômicos.
Para cada um deles, criados ao longo dos anos, inspirados, principalmente, na realidade sócio-econômica brasileira da época e sob um olhar irreverente e contestador, Chico deu vida própria, destacando particularidades através da maquiagem, do figurino, da voz, dos trejeitos da interpretação, e de bordões que sempre caíram no gosto popular: João Batista? Salomé!, É mentira, Terta?, Aff, tô morta!, Bento Carneiro, o vampiro brasileiro,Calada!, Jovem é outro papo, Tenho horror a pobre! "Quero que pobre se exploda!", "Falou… Aííí, ó…! Bateu pra tu?", Roberval… Tayyylorrr…, Sou! Mas… quem não é?, Podem correr a sacolinha…, E o salário, ó...


Professor Raimundo.


Era uma vez uma Escolinha do Professor Raimundo
Primeiro da série de personagens criados por Chico, ainda nos tempos da rádio, o Professor Raimundo foi o personagem mais querido, e sem dúvida, o que mais reverberou a generosidade aflorada, que sempre o norteou. Quantos colegas de trabalho não foram revelados novos talentos, e principalmente, quantos Chico não ajudou a não cair no ostracismo, ao ganhar um papel para contracenar na Escolinha?
Embora, considerando-se um ator de televisão, Chico também se aventurou pela pintura, literatura, teatro e música. Quer na coleção de quadros que desenhou, nos inúmeros livros que publicou, nos espetáculos que dirigiu ou nas composições que musicou, é incontestável a certeza de que Chico recebeu uma missão e a cumpriu da melhor maneira possível.

 

23/03/2012 - 15:24 | Enviado por: Lucyanne Mano -

http://www.jblog.com.br/hojenahistoria.php?itemid=29181

quinta-feira, 22 de março de 2012

CARICATURAS REAIS - Um Vizinho Original

 

 

Eu tive um vizinho original.

Era magro, comprido, poeta e tísico, tudo em grande dose. Poeta da velha idolatria das brisas, tísico do terceiro grau.

Quem o visse, à rua, enfiado no velho croisé como num tubo, espirrando para baixo as mirradas canelas, para cima, um pescoço de garça, nodoso e interminável, frágil apoio da cabecinha viva e inquieta, projetada para a frente, com o longo cavaignac de poucos cabelos e os olhos fúlgidos arregalados, quem o encontrasse hesitaria em tomá-lo por um oficial de justiça, por causa do olhar extraordinário, e ver-se-ia reduzido a não formar opinião sobre aquele estranho transeunte, malvestido, delgado, célere, como se tivesse medo de chamar atenção, fugitivo, quase fantástico.

O nosso poeta tinha uma filha moça, digna filha! Alta como o pai, como ele magra, alvíssima, talvez tuberculosa, provavelmente poetisa. Representava os restos de uns amores do poeta que deram em casamento, de um casamento que dera em droga.

Vivia das esperanças fugazes de uma cadeira de professora pública que lhe prometiam, havia anos, e que lhe não davam nunca. Além disso, tocava piano.

Tocava piano não exprime bem. A donzela, repetia, várias vezes ao dia, repisava, remola, uma certa e determinada música, invariável, pertinaz, uma espécie de balada, lânguida, desafinada, medonha!

O piano era um memorável tacho, de não sei que fabricante, diabólico. Produzia sons novos, inauditos, fenomenais, que davam idéia de fabuloso armazém de ferros velhos em revolução, harmonias assombrosas, não sonhadas por Wagner. Por um efeito incrível de contágio, parece que a enfermidade dos donos se comunicara ao piano. Eu era capaz de jurar que aquele piano estava tísico, tão perfeitamente ético como o magro vizinho. Havia notas tossidas, havia escalas escarradas... Ninguém imagina!

Deste monte de horrores, o pianista tinha a habilidade de extrair a sua música, a tal peça eterna e desesperadora.

Era um prodígio desafinado de doçuras, enxame de moscas sonoras zumbindo na clave de fá sobre pieguices requebradas e sentidas da clave de sol, como sobre compotas. Via-se na música da filha, o gênio do pai. Estava presente todo o alfenim da magra sentimentalidade dos vates da antiga escola. Era uma melodia a pingar melado; a enjoar de doçura.

O poeta adorava essa música. Alimentava o seu estro na beterraba e na cana daquele açúcar. Fecundada por essa inspiração de confeitaria, o referido estro dava à luz estrofes idiliais, onde o leite e o mel corriam pelos regatos e as cordilheiras eram legítimos pães de açúcar alinhados como na Serra dos Órgãos.

Estas obras-primas de lirismo lacrimejante e apaixonado apareciam, como sonâmbulas, a bracejar desvairadas, pelas colunas ineditoriais das folhas.

Não se calcula o sacrifício que se impunha o trovador para exalar em público, por glória de seu nome, os suspiros de sua alma a seis vinténs a linha.

Um belo dia o piano calou-se. Mau agouro! E o poeta não saía à rua...

Quando já a vizinhança se dava parabéns, pelo feliz desaparecimento do tal piano e da tal música, eis que de novo ressurge a melodia!

Desta vez, custava-se a ouvir. As janelas fechadas da casinha do poeta cobriam a música com o abafador de uma espessa surdina.

Nunca me pareceram tão profundamente irritantes aqueles sons. Possuíam, então, uma ternura estranha, pungente, revoltante! As notas não cantavam mais nem suspiravam - estertoravam. Era como uma série arquejante de derradeiros suspiros, ao longe. Uma agonia longínqua e interminável.

Fazia raiva aquilo! Terrível conspiração daquela pianista com aquele piano, daquela música com aquelas vidraças descidas... para me darem cabo dos nervos naquele dia!

Felizmente, a agonia acabou. A música subiu, num crescendo de círio expirante e morreu de chofre, como se lhe houvessem faltado as cordas do piano.

..................................................................

No dia seguinte, me explicaram o significativo da casa fechada e do reaparecimento da música. Adoecera e morrera o poeta lírico. Adivinhando a morte, mandara a filha ao piano tocar a melodia querida.

E adormecera o grande sono, ninado por aquela música, a dulçurosa irmã do seu estro.

Lirismo e tísica, escreveu o médico na certidão de óbito.

Raul Pompéia

terça-feira, 20 de março de 2012

A moça que não lia

A moça que não lê senta-se na beira da cama e disca um número que está ocupado. Coça nervosa a cabeça, acaricia o queixo, esfrega os olhos. Estende-se. A cabeça ruiva artificial afunda o travesseiro de penas. Ao lado, o pai idoso a chama. Finge não ouvir, depois vai, quase imediatamente arrependida, o coração aos saltos, atendê-lo. Morre de medo que morra, pois já se pegou dezenas de vezes imaginando como será sua vida após a morte do ancião. E, algumas vezes, percebe que a liberdade a atrai, qual a luz a atrair uma falena. Assusta-se com tais pensamentos e se recrimina. Como iria viver sem o pai? Uma prisão, o sobrado antigo, cheio de tapetes e cortinas pesadas, das quais a mãe gostava e que teme retirar para não contrariá-lo. Ele deseja que ali tudo fique igual ao tempo em que a esposa, Mariana, era viva. Adélia sufoca, rumoreja: é altamente alérgica a ácaros, disse o alergista.
“Você precisa de um ambiente asséptico”, sentencia
Ela não ousa dizer-lhe que não ousa fazer nada, nada do que realmente precisa. Espirra conformada.
– Paizinho chamou?
– Traga-me os jornais, florzinha.
No dia em que a chama de florzinha, está meigo a ponto de melar, pegajoso, dependente. Quando é dia de fera, chama-a de “Bela”, ironizando seus olhos estrábicos e sorriso de dentes amarelos.
“Como uma mulher tão linda quanto sua mãe pôde engendrar dentro de si uma mandruvá como você?”
Desde pequena, ouve isso.E o pior é que nunca Mariana contestou o marido dedicado e mordaz. Decerto reconhecia-se lindíssima e, na filha, todos os traços da cunhada solteirona. Foi o que Adélia jogou na cara do velho num dia de TPM braba.
– Pois é, sou a cara de tia Rina –, que puxou para o bisavô, violinista e feioso.
O pai passou três dias sem falar com ela, que implorava:
– Paizinho, olha para mim...Faz que olha... Toma um beijinho...
E nada. Só voltou a encará-la quando engasgou e ela o salvou do sufocamento, batendo nervosamente em suas costas. Falar, só falou no dia em que o comprimido de Propanolol caiu e ele teve medo de ficar sem tomá-lo e morrer. Queria viver apenas por temer a Morte, pois nada o segurava aqui.
Quando a chamava de “Bela”, ela se encolhia, tinha colite, ia para o quarto, onde ficava olhando para o teto Conseguia a façanha de nada pensar por momentos, como na meditações orientais. Aí então era que os mais terríveis segredos vinham fazer cobranças. Da cama para o banheiro. Daí, um dia, para o hospital. Um dos primos ricos anunciou:
– Vou pagar um enfermeiro para seu pai.
E as primas, furiosas: – Ela não faz nada, deixa cuidar do tio...
Ciro, esse primo mais velho, foi irredutível. Na juventude fora alucinado pelas belas pernas da prima Adélia. Inexperiente, pensava que a feiúra sumiria com o tempo, já que a tia era linda daquela maneira, parecendo Ava Gardner. O tempo passou e como ela não embelezou, casou-se com Lindalva, uma gordinha alegre e, quando ficou viúvo, casou-se de novo Com a massagista da esposa... Ah, aquelas mãos... Adélia quase morreu de colite. Por meses, acalentara a idéia de que , por fim, o primo rico casar-se-ia com ela. Virgem, por sempre ter temido o pai irônico, agora, andava a arder...
Levavam-lhe palavras cruzadas. Aconselhavam que escrevesse poesia. Ou livros infantis... Mas como, se filha única, não tinha a menor idéia do que uma criança gostava? Os primos netos, achava uns chatinhos ou diabinhos. Formara-se em Letras indo à Faculdade como quem frequenta a ópera: muitas cenas e personagens... decoreba total das matérias. E nada aprendera. Nos trabalhos de grupo, pagava o lanche da turma, sorvete ou cerveja – ela olhava, nada bebia. Aí, deixavam que os assinasse.
– Sofro de dislexia – explicava –, sou incapacitada para a leitura. Mas não quero que os professores saibam, senão vão me rotular de debilóide.
No primeiro e segundo graus, usara o mesmo artifício. Um colega que morava perto e que a conhecia desde a primeira série, comentou:
– Adélia não lê, não come direito. É fascinada por essas pessoas que vivem de Prana: alimenta-se de ar...
Riam, mas aceitavam seus subornos. O dinheiro vinha de uma pequena mesada que lhe dava seu avô Herculano, então vivo:
– Para seus alfinetes.
Como nos tempos de Machado de Assis, pensaria ela, se lesse. Mas a moça não lia. E a moça-velha de hoje não gastava em alfinetes, mas em comida para seus colegas que liam...
O enfermeiro, porém, vivia lendo. Ela às vezes, passava pelo quarto do pai decrépito e encontrava o rapaz cabeceando, mas sem largar o livro, pousado sobre o colo. Numa noite, em que pensou ter ouvido a tosse do pai, levantou-se para chamar a atenção do acompanhante. Num impulso, foi até ele e pegou o exemplar: Ana Karenina, de Tolstoi... Pesado e velho, encadernado com lombada de letras douradas quase apagadas,a retirada do livro revelou-lhe algo inusitado ao seu olhar curioso: a ereção do moço adormecido. Não conseguia tirar os olhos daquele outro volume. Sabia evidentemente,do que se tratava. As primas falavam daquilo, daquele fenômeno masculino. “Deve estar pensando em mim”, concluiu maravilhada. Já surpreendera o olhar de André em suas pernas, seu único atributo visível de beleza.
Afogueada, foi para o quarto.O coração, corcoveando. Correu os olhos pelo quarto e viu, numa prateleira, um livro. Levantou-se e apanhou-o. Era a Bíblia. Folheou-a distraída, enquanto pensava que se ele gostava tanto de ler, teria de fazê-lo também, para ter o que falar...
“Teus peitos são duas pombas”, leu nos Cânticos de Salomão. Passou a mão nos seus, que arfavam. “Parecem mesmo peitos estufados de pomba!” Abriu os botões da blusa e, de olhos fechados, acariciou-os. De repente, sentiu um peso a mais. Duas mãos pesadas, inquietas, exigentes. E a boca.
Agora, Adélia lê sem parar. Relê cada cena de amor que os escritores tão bem descrevem. Aprende cada vez mais. As primas estrilam, ciciam, ladram.
– Não está vendo que ele é muito mais novo que você e só quer sua herança?
Ela não se incomoda. Enche a casa de livros, já que não pode enchê-la de filhos. O moço é cuidadoso, respeitoso quando a parentada chega. Mas à noite! Ah, à noite! As pernas são abertas como páginas e os peitos umedecidos como quem vai virar as folhas.A fantasia inebria o casal. No dorso do imaginário, cavalgam nas nuvens. Ele faz de conta que ela é uma personagem nova e viçosa. Ela é protagonista de sua própria história. Quando o velho e odioso pai morre, um riso de luxúria ecoou pelo quarto da filha. Uns dizem que o enfermeiro matou o paciente. Outros que ela gostou disso. A parentela envergonha-se do romance escancarado
– Dizem que os vizinhos nem podem dormir, de tanto que ela mia.
O velho detetive que mora à esquerda tem certeza de que foi morte natural. “Deixem a mulher ser feliz”, sentencia. Mas as vizinhas da esquina andam revoltadas. “Como é que aquela lambisgóia conseguiu um marido daqueles?”, indagam perplexas.
Já os fantasmas do pai e da mãe, perambulando pelo casarão, se entreolham e sorriem. Adoram ver Adélia lendo Baudelaire para o marido, às três da manhã, com as pernas engatadas nas dele, enquanto ele, bem devagar, vai despetalando as roupas de seda daquele corpo formoso. Folheando detalhes. De olhos fechados, embora. E ouvidos bem abertos...

Clevane Pessoa

segunda-feira, 19 de março de 2012

Diário de uma Gordinha



 Na Segunda-feira eu começo minha dieta sem falta.
Ontem o Rodrigo me ligou. Fiquei ansiosa e comi uma caixa de bombom. Acho que estou apaixonada por ele. Sei lá, porque ele me lembra Brad Pitt, Jude Law, Henri Castelli. Talvez por isso eu seja louca por Serenata de amor.
02h00min - Eu acordada, pensando na vida. Entro na internet. Caio na rede, sozinha no meu quarto e nua. Meu nick é maior abandonada do Leblon . Eu quero um homem, eu preciso de um homem, necessito de um macho. Meu corpo pede um homem, minha pele quer um cheiro masculino.
03h00min . Não consigo ninguém na internet, vou à cozinha e devoro um pedaço de torta de limão.
Hoje é sábado e o Rodrigo ainda não me ligou tô mal, muito mal. Vou fazer brigadeiro.
À tarde fui ao salão, fiquei boba ao encontrar a Julita, neta da dona Judite. Meu Deus! Que garota feia, magrela, branca, puro osso. Sou mais eu!
Domingo ,
Ouvi Adriana Calcanhotto o dia inteiro. Esse vazio que há dentro de mim, essa solidão que me corrói,ouço música penso no Rodrigo, choro e devoro brigadeiro.
Hoje é Domingo e a única sobremesa que eu quero é o Rodrigo, se bem que o Diego do 907 é um verdadeiro quindim. Que pão de garoto.
Terça-feira. OUTRA SEMANA
Coloquei uma mini-saia. Dane-se as gordurinhas. Percebi como meu porteiro me devorou com os olhos. E o seu Edgar do 301. Velho safado!
Quinta-feira.
ODEIO A LUANA PIOVANI. ELA É LINDA, MAGRA, LOIRA E TEM UM NAMORADO MA-RA-VI-LHO-SO.
Sexta-feira. Arrasada.
Engordei mais quatro quilos.
Sábado
Novamente DEPRIMIDA. Vi o Rodrigo correndo na praia e a Flavinha me contou que aquele gato que estava com ele, era na verdade namorado dele. Que ódio. Ia levar gato por lebre novamente.
Domingo - DEPRIMIDA
Segunda-feira
Vou começar minha dieta novamente.
Terça-feira. De dieta só por hoje.
Quarta-feira. Não resisti e comi doce no aniversário da Izabel.
Ah! Eu juro que na Segunda-feira eu começo tudo de novo.
Ps: Ah! Eu conheci um menino lindo no cursinho de inglês. Ele assim, como eu é fã de Glória Gaynor
Francisco Malta

domingo, 18 de março de 2012

CERIMÔNIA DE PASSAGEM

     

     

    “a zebra feriu-se na pedra
                                        a pedra produziu lume”

    a rapariga provou o sangue
    o sangue deu fruto

    a mulher semeou o campo
    o campo amadureceu o vinho

    o homem bebeu o vinho
    o vinho cresceu o canto

    o velho começou o círculo
    o círculo fechou o princípio

                               “a zebra feriu-se na pedra
                                 a pedra produziu lume”

                                                                          Ana Paula Tavares

    Do livro: "Ritos de Passagem", Cadernos Lavra e Oficina, 1985

sábado, 17 de março de 2012

Triste Bahia

    Triste Bahia! Ó quão dessemelhante
    Estás e estou do nosso antigo estado!
    Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado,
    Rica te vi eu já, tu a mi abundante.

    A ti trocou-te a máquina mercante,
    Que em tua larga barra tem entrado,
    A mim foi-me trocando, e tem trocado,
    Tanto negócio e tanto negociante.

    Deste em dar tanto açúcar excelente
    Pelas drogas inúteis, que abelhuda
    Simples aceitas do sagaz Brichote.

    Oh se quisera Deus que de repente
    Um dia amanheceras tão sisuda
    Que fora de algodão o teu capote!

                    Gregório de Mattos

      Do livro "História concisa da Literatura Brasileira", de Alfredo Bosi, Editora Cultrix, 1994, SP. Enviado por: Leninha

    sexta-feira, 16 de março de 2012

    Professores e poetas…

     

     

     

    o poeta e o relógio

    os bicos das manhãs
    à espera do poeta
    o ofício exercido de unhas
    à espera do poeta

    a rua entreaberta de vespas
    à espera do poeta

    O sol-pôr líquido de nuvens
    à espera do poeta

    a lua embriagada de amores
    à espera do poeta

    : canções

    o poeta espera o silêncio
    o relógio vigia os homens

    Merivaldo Pinheiro

    Do livro: Caminhos de poe(a)mar, Ed. autor, 2007, RJ

    ………………………………………………………….

     

    CARTA DE UM PROFESSOR (*)

    Caro Juremir (CORREIO DO POVO/POA/RS)

    Meu nome é Maurício Girardi. Sou Físico. Pela manhã sou vice-diretor no Colégio Estadual Piratini, em Porto Alegre , onde à noite leciono a disciplina de Física para os três anos do Ensino Médio.   Pois bem, olha só o que me aconteceu: estou eu dando aula para uma turma de segundo ano. Era 21/06/11 e, talvez, “pela entrada do inverno”, resolveu também ir à aula uma daquelas “alunas-turista” que aparecem vez por outra para  “fazer uma social”.  Para rever os conhecidos.
    Por três vezes tive que pedir licença para a mocinha para poder explicar o conteúdo que abordávamos.
    Parece que estão fazendo um favor em nos permitir um espaço de fala. Eis que após insistentes pedidos, estando eu no meio de uma explicação que necessitava de bastante atenção de todos, toca o celular da aluna, interrompendo todo um processo de desenvolvimento de uma idéia e prejudicando o andamento da aula. Mudei o tom do pedido e aconselhei aquela menina que, se objetivo dela não era o de estudar, então que procurasse outro local, que fizesse um curso à distância ou coisa do gênero, pois ali naquela sala estavam pessoas que queriam aprender' e que o Colégio é um local aonde se vai para estudar.
    Então, a “estudante” quis argumentar, quando falei que não discutiria mais com ela.
    Neste momento tocou o sinal e fui para a troca de turma. A menina resolveu ir embora e desceu as escadas chorando por ter sido repreendida na frente de colegas. De casa, sua mãe ligou para a Escola e falou com o vice-diretor da noite, relatando que tinha conhecidos influentes em Porto Alegre e que aquilo não iria ficar assim. Em nenhum momento procurou escutar a minha versão nem mesmo para dizer, se fosse o caso, que minha postura teria sido errada. Tampouco procurou a diretoria da Escola.
    Qual passo dado pela mãe?  Polícia Civil!... Isso mesmo!... tive que comparecer no dia 13/07/11, na  8ª (oitava Delegacia de Polícia de Porto Alegre) para prestar esclarecimentos por ter constrangido (“?”) uma adolescente (17 anos), que muito pouco frequenta as aulas e quando o faz é para importunar, atrapalhar seus colegas e professores'. A que ponto que chegamos? Isso é um desabafo!... Tenho 39 anos e resolvi ser professor porque sempre gostei de ensinar, de ver alguém se apropriar do conhecimento e crescer. Mas te confesso, está cada vez mais difícil.
    Sinceramente, acho que é mais um professor que o Estado perde. Tenho outras opções no mercado. Em situações como essa, enxergamos a nossa fragilidade frente ao sistema. Como leitor da tua coluna, e sabendo que abordas com frequência temas relacionados à educação, ''te peço, encarecidamente, que dediques umas linhas a respeito da violência que é perpetrada contra os professores neste país''.

    Maurício Girardi

    (*) Carta publicada no jornal Correio do Povo, Porto Alegre (RS) em 16 de julho de 2011
    Enviado por Astrid Cabral

    quinta-feira, 15 de março de 2012

    Prosa de Fabrício Carpinejar e outros etc…

     

    AS MEIAS VERMELHAS DO MEU TIO-AVÔ

     

    Escrevi sobre o padre Nejar e recebi inúmeras confidências dos leitores.
    Agora, sim, acho que o conheço bem. Conhecemos uma biografia quando desfrutamos de informações suficientes para mentir a seu respeito.
    Já poderia, portanto, mentir sobre Alberto Nejar, meu tio-avô, mas desejo expor uma verdade.
    A verdade sempre me seduziu mais do que a mentira. A mentira impressiona, a verdade emociona.
    Alberto Nejar era monsenhor da Igreja São Geraldo.
    Passou a vida esperando ser bispo, pois estava a um passo da recompensa profissional. Tratava-se da próxima escala; natural, previsível. Assim como depois de um capitão vem a estrela de major, assim como depois de um capitão-tenente vem a cruz bordada de capitão de corveta.
    Alberto aguardava assumir o ruivo do solidéu, o rubro da batina. Ansiava pelo reconhecimento do trabalho comunitário, da evangelização dos jovens pelo esporte, das campanhas de agasalho e acampamentos no Interior.
    O que me entristece é que ele, tão certo da promoção, tão convicto da transição, comprou meias vermelhas de bispo jurando que seria chamado. E não foi. Nunca foi.
    Ele dormia com meias vermelhas de bispo para atrair sorte, talvez para convencer o destino a entregar a carta do Vaticano no dia seguinte. E não veio. Nunca veio.
    É um desconforto projetar o quanto ele sofreu em silêncio. O quanto padeceu em segredo para não ser tachado de ambicioso.
    Mas alguém incutiu a esperança nele, Alberto não concluiu sozinho que seria bispo. Tudo deve ter partido de uma insinuação, de uma fofoca. Alguém influente torturou Alberto com sua própria fé. Criou uma falsa expectativa para retirar o resto pouco a pouco, para deserdá-lo do sentimento de justiça e retribuição que tinha pela vida.
    O exemplo de meu tio renova meu cuidado na hora de conversar: não temos o direito de maltratar a esperança do outro.
    Se não ama seu namorado ou sua namorada, deixe ir, não fique prendendo por comodidade e vaidade. Se um convite desagradou, diga de cara, não torture com desculpas. Se está interessado em promover um funcionário, faça logo, não fique adiando ou explorando a expectativa para que o sujeito trabalhe mais. Se pretende oferecer um presente,  dê rápido, sem suspense, não realize chantagem.
    Há a necessidade de ser direto e evitar insinuações que provoquem mal-entendidos. Não procure o benefício da dúvida, e sim a lealdade da palavra.
    Falar a verdade o quanto antes, para que a pessoa possa adaptar-se com a perda, criar um novo sonho e mudar a cor das meias.

    Fabrício Carpinejar

    Fonte: http://carpinejar.blogspot.com/

    ………………………………

    Nascimento de Afrânio Coutinho (1911, Salvador/BA)

    Falecimento de Fernando Allah Moreira (2011, Brasília/DF)

    Literatura

    Poesia

     Temática autobiográfica: Raul Miranda

    Prosa

     Temática cores: Fabrício Carpinejar

    Site de Leila Míccolis

     Coluna mensal de Bárbara Bandeira Benevento: RaBicho, em defesa da vida animal

     Abaixo-assinado para criação de hospitais veterinários públicos, assine e divulgue

    quarta-feira, 14 de março de 2012

    Casa velha, coisas velhas

    Numa noite quente qualquer, o futuro escritor escrevia um dos seus primeiros contos. Sentava-se à mesa de jantar numa sala do casarão talvez já centenário na ocasião. Como ainda era apenas projeto de ficcionista, não tinha espaço próprio na casa velha: era, ainda, um escritor sem escritório. Mas já tinha de seu uma biblioteca. Modesta e bem sortida, uma biblioteca para chamar de sua. Os livros integravam-se ao ambiente, de meio a vasos, enfeites, crianças, fotografias e, claro, móveis e louças. Animais não eram admitidos no interior da residência.
    A casa fora construída junto à calçada, como era hábito na época da sua ereção (consulte antes o dicionário, por obséquio, quem pretender esboçar um sorriso malicioso, aqui inconveniente), com porta e janelas debruçando-se sobre os passantes que traziam notícias e levavam informações. Dessas aberturas — ponto estratégico — controlava-se a entrada e saída de gentes, cavalos e veículos que procuravam a praça central da cidade. Para trás, virado para o nascente e para a Ilha, o terreno abrigava dois coqueiros carregados de cachos de butiá, um campinho de futebol, muita árvore e gramado, e terminava nas areias da Baía Sul, que limitavam sua continuação; hoje, é um aterro com avenida por cima que o reprime, com bem menos poesia e encanto do que o mar.
    De um lado morava o Jayro Schmidt, do outro havia um palacete sinistro onde teria ocorrido há tempos um crime passional com o emparedamento da jovem e bela dona da casa; atravessando a rua, subia-se o morro quase à frente do casarão para encontrar de súbito o cemitério da cidade, povoado de vetustos cidadãos do lugar.
    O casarão: vinha com porão alto e frequentável, com um vasto sótão infestado de cupins, com ruídos noturnos inesperados e suspeitos, com um razoável elenco de fantasmas. Destes, o mais notável leva o nome de Germano, cujo túmulo, perfeitamente identificável, o espera no cemitério próximo. Germano tem por hábito perseguir senhoras idosas dentro da casa, obrigando-as a correr mesmo incapacitadas para a celeridade dos deslocamentos. Alcançando-as, vampiresco, ele as morde nas costas. Nunca se soube com precisão o que acontece depois desse abraço por trás: talvez o terror e o pudor — ou o prazer — impeçam essas senhoras, pobres vítimas, de detalhar os fatos posteriores. Lá, dormia-se com a luz acesa.
    As pessoas nascidas ao tempo deste alvorecer para a literatura acima referido estarão em final de carreira se forem jogadores de futebol, terão completado o doutorado caso hajam enveredado pela pesquisa e o magistério, ainda não se terão casado, e muitas viverão com os seus filhos na casa dos pais, desobrigadas de compromissos mais sérios em sua vida particular: não faz tanto tempo assim, portanto. Um escritor escrevia à mão ou com máquina de escrever manual, pois as elétricas, caríssimas, eram para as firmas de sucesso e os computadores, exclusividade de raríssimas empresas de grande porte. A música e o mundo lhe chegavam pelas ondas hertzianas, como proclamavam os locutores, em radinhos de pilha japoneses. O Japão era a China de hoje.
    O conto que falava do casarão, da sua vizinhança e do seu morador mais ilustre, o Germano, foi bruscamente interrompido naquela noite quente que já avançava bem porque algo queimou e inchou dolorosamente, de imediato, o pé esquerdo do escritor, obrigando-o a correr para a emergência do hospital, que ficava longe — obra, talvez, dum inseto. Que jamais foi localizado.

    Amilcar Neves

    Dia Nacional do poeta

     

     Nascimento de Glauber Rocha (1939, BA), cordel de Gustavo Dourado

     Nascimento de Carlos Heitor Conny (RJ)

    Falecimento de Karl Marx (1883, Londres), poesia de Leila Miccolis

    Dia Nacional do Poeta

     

    Frases da semana (Seleção de Leila Míccolis)

    "O ritmo é o que faz a poesia persuasiva e não informativa" - José Hierro

    "A poesia é uma forma de produção. Dificílima, complexíssima, porém produção" – Mayakovski

    "Poesia são pensamentos que respiram, e palavras que queimam" - Thomas Gray

    Poesia: temática mensal: Poesia/Poetas

    Prosa temática mensal: Poesia/Poetas

    Nascimento de Castro Alves (Curralinho/BA, 1847)

    Falecimento da poeta Colombina (1963, SP/SP)

    In Memoriam: poema de Selmo Vasconcellos para o poeta Zanoto

    Temática autobiográfica: Astrid Cabral

    terça-feira, 13 de março de 2012

    Nascimento de Cacaso (Antonio Carlos de Brito)

     

    Uberaba/MG, 13/3/1944 - RJ, 27/12/1987. Professor universitário, letrista. Cacaso muda-se aos 11 anos para o Rio de Janeiro, onde estuda Filosofia e, nas décadas de 1960 e 1970, leciona Teoria da Literatura e Literatura Brasileira na PUC-RJ. Colaborador regular de revistas e jornais, como Opinião e Movimento. Como poeta estreou em 1967 com A Palavra Cerzida, livro que foi recebido com entusiasmo pelo crítico José Guilherme Merquior. Em 1974, lança Grupo Escolar (mostrando um poeta em busca de novos caminhos, pela Coleção Frenesi. Cacaso une-se então a outros poetas, como Eudoro Augusto, Carlos Saldanha e Chacal, formando a coleção Vida de Artista, pela qual lançou Segunda Classe, 1975 (em parceria com Luiz Olavo Fontes) e Beijo na boca (1975). É um dos "26 poetas hoje", org. Heloísa Buarque de Hollanda (1976). Vieram depois: Na Corda bamba (1978), Mar de mineiro (1982) e Beijo na boca e outros poemas que reunia toda obra até 1985. Boa parte de sua produção poética está em Não quero Prosa, publicado pela UFRJ/Ed. Unicamp, 1997, reorganizado e apresentado pela professora e escritora Vilma Arêas.

    domingo, 11 de março de 2012

    Octávio Ianni por Rogel Samuel

     

    Foto: Antoninho Perri/Neldo

    Eu soube em 2004 do falecimento de Octávio Ianni por meio de telefonema de Renan Freitas Pinto. Renan foi seu aluno e amigo. Escreveu uma tese sobre Florestan Fernandes, que deve ser publicada. Orientada por Ianni.
               Creio que fui um dos primeiros a anunciar a perda. E um dos poucos. Até o momento em que escrevo, não li nada escrito na grande imprensa a respeito. No dia que anunciei, dois dias depois da morte, não encontrei nenhuma notícia que me confirmasse o fato. Temi estar divulgando uma notícia errada, uma mentira. Tive vontade de telefonar de novo para o Renan, pedindo maiores detalhes.
                No dia seguinte, encontrei uma notícia. No site do MST, o Movimento dos sem Terra. Aí compreendi tudo. Um muro de silêncio cercou o caso.
                Logo após li notícia vinda de Cuba (!), de Havana, a 5 de abril. De um jornal de lá. O título dizia: "Morre um dos maiores sociólogos brasileiros".
               Curioso como o obituário é revelador. Certa vez, num mesmo dia, morria Henriqueta Lisboa e Orson Welles. A morte de Welles saía na primeira página do jornal. A de Henriqueta era apenas uma nota paga no obituário.
               E não é uma questão ideológica. A morte de Pedro Calmon, tido como homem da elite conservadora (o que não concordo, pois o conheci), não ocupou nenhuma manchete. Ficou no obituário.
               Não conheci pessoalmente Octávio Ianni.
               Ele faleceu no dia 4 de abril, aos 77 anos. Era professor emérito da Universidade de São Paulo. Foi sepultado na cidade de Itú.
               Professor em várias universidades brasileiras e no exterior, no México, Estados Unidos, Espanha e Itália. Nos últimos anos orientava seus alunos e pesquisadores no Instituto de Filosofia e Ciência Humana da Universidade de Campinas.
               Ele sofria de leucemia havia algum tempo e finalmente estava internado no hospital Albert Einstein.
               Além de professor aposentado da Universidade de São Paulo (USP), foi professor emérito da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), docente visitante da Universidade de Columbia, em Nova York. Teve os direitos políticos cassados pelo regime militar em 1969, quando passou a dar aulas no Exterior. Voltou ao Brasil em 1977, tornou-se professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
               Era marxista. Estudou na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, onde foi discípulo de Florestan Fernandes.
               Escreve muitos trabalhos, entre os quais: Homem e Sociedade (1961); Metamorfoses do Escravo (1962); Industrialização e Desenvolvimento Social no Brasil (1963); Política e Revolução Social no Brasil (1965); Estado e Capitalismo no Brasil (1965); O Colapso do Populismo no Brasil (1968); A Formação do Estado Populista na América Latina (1975); Imperialismo e Cultura (1976); Escravidão e Racismo (1978); A Ditadura do Grande Capital (1981); Revolução e Cultura (1983); Classe e Nação (1986); Dialética e Capitalismo (1987); Ensaios de Sociologia da Cultura (1991); A Sociedade Global (1992); A Idéia do Brasil Moderno (1992); e O Labirinto Latino Americano (1993).
    (Texto postado originariamente no blog do autor em 8 de novembro de 2011)

    quinta-feira, 8 de março de 2012

    Dia Internacional da Mulher em Blocos

     

     

    Pintura: Matisse

    em poesia  

    Antecipação de Eliane

    No princípio era um sorriso
    uma flor
    e era luz e poesia de um instante

    No princípio era o pássaro
    talvez sonho, talvez brisa
    talvez lembrança do nada

    No princípio era seu nome
    uma promessa

    Antes de ser
    passou pelo momento esperado
    antecipou-se a si mesma

    Eliane tirou o sentido da
    palavra véspera

    Mauro Salles

     

    e em prosa

     

    Um Mundo de Mulheres

    Éramos uma idéia e um caminho. Éramos contraditórias e confusas. Éramos mãe, esposa e dona-de-casa. Hoje somos muito mais... Minha bisavó era mulher. Minha avó, também. Mamãe era mulher. Muitas irmãs dela, também. Minha irmã é mulher e tem uma filha que é mulher. Outras sobrinhas são mulheres. Minha dentista é mulher. A pneumologista, a advogada e a dermatologista são mulheres. Minha melhor amiga é mulher. Aquela que pintou o quadro é mulher, que cantou aquela música, também. Minha primeira professora era mulher. Somos aquelas que fazem a história e somos espirituais. Somos aquelas que comungam as mesmas idéias e sonham como poetas. Enaltecemos nossos feitos. Não somos mais parte de um todo, somos O Todo. Somos uma explosão. Somos um fenômeno político-social. Somos Sapho, somos O Segundo Sexo e tornamo-nos mulheres. Chamamo-nos Lourdes, Marlene, Clara, Maria, Iracema, Luciana, Leila, Simone, Zuleica, Gladys, Flávia, Márcia, Lídia... Somos precursoras, somos protagonistas. Ou somos sem nomes: índias, brancas e negras, domésticas, operárias, etc... Somos africanas, americanas, asiáticas, européias ou oceânicas.
    Somos a vida, somos a morte,
    a alegria e a tristeza.
    Somos a rosa e a orquídea,
    a felicidade e a angústia.
    Somos a sensibilidade.
    Somos internacional!

    Leninha

    quarta-feira, 7 de março de 2012

    Passagens, poesia, prosa, abaixo-assinado e Marli Berg

     

     

    Falecimento de Juvenal Galeno (1931, Fortaleza/CE)

    Literatura

    Poesia

     Temática artes irmãs: Salgado Maranhão

     Temática Vida!: Pedro Maciel

    Prosa

     Coluna de Marli Berg: "Livros em Blocos"

     Temática mensal: poesia/poeta, Octávio Paz

    Site de Leila Míccolis

     Coluna quinzenal de Vânia Moreira Diniz

     Cachorrada: foto de Luka, um cachorrinho superstar

     Abaixo-assinado para criação de hospitais veterinários públicos, assine e divulgue

     

    1. Mulher na História/ Biografia

    Uma mulher fascinante, um ícone do século XVIII, a inglesa Georgiana, Duquesa de Devonshire, foi patronesse das artes, romancista e escritora, cientista amadora e musicista, além de ter atuado com força no mundo político.

    Em Georgiana, Duquesa de Devonshire (Objetiva) da autora inglesa Amanda Foreman, entramos em contato com uma mulher fascinante, que amava homens e mulheres, e viveu um ménage a trois com o marido e a melhor amiga, lady Elizabeth Foster (também amante do Duque), sendo que, em meio a esta relação erótica a três,  ambas tiveram filhos, com o duque e outros homens. Só a vida amorosa de Georgiana já a tornaria extremamente moderna para sua época, uma mulher a frente de seu tempo, mas, na verdade, ela se sentia imensamente frustrada pelas restrições que impunham às mulheres no século XVIII. Ao  criar sua própria identidade, impondo-se no mundo como ser independente, Georgiana acabou se tornando uma figura relevante para  as mulheres contemporâneas, e deixando um lindo exemplo de luta política, intelectual e, principalmente, de liberdade amorosa. Georgiana, um  eterno ícone feminino, numa excelente biografia.

    2 - Mulher na Bíblia / Contos

    Um feito da imaginação da autora inglesa R.M. Lamming, Vozes do Éden (Bertrand Brasil) retrata, em primeira pessoa, momentos cruciais de sete fortes personagens bíblicas femininas – do Gênesis, do Êxodo e dos Evangelhos – com clareza e paixão. Eva, nossa mãe, a filha do faraó que resgata Moisés das águas do Nilo  e o cria como filho, Cláudia, esposa de Pôncio Pilatos, que tenta impedir seu marido de condenar um homem chamado Jesus à morte, são  figuras deste livro de contos interessantíssimo, que traz ainda Sara, mulher de Abraão, Agar, a escrava que com ele tem o filho Ismael, que dá origem ao povo árabe, Marta, grande figura do Evangelho e a mulher de Jó.

    A descrição que a autora faz da amargura destas mulheres é magistral, e mostra, com clareza, como estas figuras atormentadas se rebelam contra a Divina Providência. Um verdadeiro romance épico, com histórias inesquecíveis de mulheres fortíssimas, que atravessam a história há muitos  milênios, e que, apesar de serem grandiosas e emblemáticas, jamais deixaram seus homens de lado. Afinal, sabemos todas, desde tempos imemoriais que a coisa mais importante da existência é nossa convivência com este delicioso sexo oposto, o homem, que nos dá prazer físico, companhia, proteção e, quando é realmente maravilhoso, cumplicidade. Mulheres bíblicas maravilhosas, eternas e poderosas.


    3 - Mulheres na Literatura / Romance Português

    Diário de Tua Ausência (Bertrand Brasil), da escritora, professora e jornalista portuguesa Margarida Rebelo Pinto, é a história de amor entre uma mulher e um estrangeiro, que, numa situação improvável, se encontram somente para terem de se afastar. O livro é uma longa carta, comovente e sincera, um desabafo escrito por uma mulher abandonada, que não se conforma com a situação, e nunca vai desistir de amar, pois nada será mais importante, em sua vida, que o amor.

    A narrativa é profundamente feminina e romântica, afirma a fé total no amor, e cria,  com este belíssimo livro, um verdadeiro hino ao amor, que os homens deveriam cantar se quisessem ter uma vida afetiva plena como a que nós, mulheres, modéstia a parte, costumamos viver .Margarida Rebelo Pinto honra a tradição lusa de ser uma das melhores literaturas do mundo, e com seu texto enxuto, elegante, visceral e apaixonado, dá a nós, mulheres, uma aula de como deve ser o verdadeiro amor, que nos impulsiona a gerar novos seres, e continuar a construção do mundo. Um romance e uma escritora que envaidecem e orgulham o sexo feminino.

    4 - Mulheres na Ciência/ Biologia/ Meio-Ambiente

    Sob o Mar-Vento (Gaia)  foi o livro de estréia da bióloga norte-americana Rachel Carson, e assinalou o surgimento de uma das mais refinadas autoridades do século XX na área científica. Editado em 1941, em plena Segunda Guerra Mundial, seu livro não teve a acolhida merecida na época, mas ressurgiu com toda força, levando o ex-vice-presidente norte-americano Al Gore, conhecido ativista na área ambiental, a afirmar que foi Rachel Carson uma das razões que o levou a tomar tanta consciência do meio ambiente.

    O livro descreve, com precisão, o comportamento de peixes e aves marinhas, num estilo que mistura  jornalismo e  literatura, e, além de altamente informativo, é cativante, tendo se transformado em best-seller. Carson morreu aos 56 anos, em 1964, deixando quatro livros, sendo que um deles, Primavera Silenciosa (também publicado pela Gaia) foi considerado, em 2000, pela Escola de Jornalismo de Nova Iorque, como uma das maiores reportagens investigativas do século XX. Em dezembro de 2006, o jornal britânico The Guardian conferiu a ela o primeiro lugar na lista das cem pessos que mais contribuíram     para a defesa do meio-ambiente de todos os tempos. Uma mulher fantástica, inspiradora, que merece o lugar de honra que ganhou na ciência e na vida.

    5 - Mulheres no Crime/ Romance Americano

    Mulher incrível, a tenente Eve Dallas é linda, encara qualquer criminoso e, como se tudo isto não bastasse, é casada com o milionário e gatésimo Roarke, um homem fascinante, que toda mulher gostaria de chamar de seu. Onde encontrá-la? Nas páginas da série policial mais Cult do momento, a Série Mortal, da qual é protagonista,  já no décimo oitavo volume, Dilema Mortal (Bertrand Brasil), que acaba de chegar às livrarias.

    Neste romance, tenso e vibrante, Eve precisa lidar com um caso de duplo homicídio, em que nem tudo é o que parece, e mostra que, além de todas as qualidades já mencionadas, é profundamente inteligente na hora de traçar suas estratégias. Escrita por Nora Roberts —   sob o pseudônimo J. D. Robb —   uma escritora que é, também, uma mulher de fibra e altamente vitoriosa, já que escreveu quase duzentos romances, dos quais cem foram parar na lista de Best-sellers do New York Times, um verdadeiro recorde. Com mais de 280 milhões de exemplares vendidos em diversos países, Nora é, hoje, a mais festejada autora de ficção em todo o mundo. Duas mulheres incríveis – autora e personagem – que devem ser festejadas, homenageadas e, se possível, imitadas, no Dia Internacional da Mulher.

    Feliz Dia para todas nós!

    segunda-feira, 5 de março de 2012

    125º aniversário de Villa-Lobos

     

     

    Heitor Villa-Lobos (Rio de Janeiro, 5 de março de 1887 – Rio de Janeiro, 17 de novembro de 1959) foi um maestro e compositor brasileiro. Destaca-se por ter sido o principal responsável pela descoberta de uma linguagem peculiarmente brasileira em música, sendo considerado o maior expoente da música do modernismo no Brasil, compondo obras que enaltecem o espírito nacionalista, ao qual incorpora elementos das canções folclóricas, populares e indígenas.

    Filho de Noêmia Monteiro Villa-Lobos e Raul Villa-Lobos, foi desde cedo incentivado aos estudos, pois sua mãe queria vê-lo médico. No entanto, Raul Villa-Lobos, pai do compositor, funcionário da Biblioteca Nacional e músico amador, deu-lhe instrução musical e adaptou uma viola para que o pequeno Heitor iniciasse seus estudos de violoncelo. Aos 12 anos, órfão de pai, Villa-Lobos passou a tocar violoncelo em teatros, cafés e bailes; paralelamente, interessou-se pela intensa musicalidade dos "chorões", representantes da melhor música popular do Rio de Janeiro, e, neste contexto, desenvolveu-se também no violão. De temperamento inquieto, empreendeu desde cedo escapadas pelo interior do Brasil, primeiras etapas de um processo de absorção de todo o universo musical brasileiro. Em 1913 Villa-Lobos casou-se com a pianista Lucília Guimarães, indo viver no Rio de Janeiro.

    Em 1922 Villa-Lobos participa da Semana da Arte Moderna, no Teatro Municipal de São Paulo. No ano seguinte embarca para Europa, regressando ao Brasil em 1924. Viaja novamente para a Europa em 1927, financiado pelo milionário carioca Carlos Guinle. Desta segunda viagem retorna em 1930, quando realiza turnê por sessenta e seis cidades. Realiza também nesse ano a “Cruzada do Canto Orfeônico" no Rio de Janeiro. Seu casamento com Lucília termina na década de 1930. Depois de operar-se de câncer em 1948, casa-se com Arminda Neves d'Almeida a Mindinha, uma ex-aluna, que depois de sua morte se encarrega da divulgação de uma obra monumental. O impacto internacional dessa obra fez-se sentir especialmente na França e EUA, como se verifica pelo editorial que o The New York Times dedicou-lhe no dia seguinte a sua morte. Villa-Lobos nunca teve filhos.

    Faleceu em 17 de novembro de 1959. Encontra-se sepultado no Cemitério São João Batista no Rio de Janeiro.

    Em 1960, o governo do Brasil criou o Museu Villa-Lobos na cidade do Rio de Janeiro.

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Heitor_Villa-Lobos

     

    Extra - 5 de março:

     Nascimento de Patativa do Assaré (1909, Assaré/CE)

     Dia Nacional da Música Clássica, Diógenes Pereira de Araújo

    Frases da semana :

    "Permita-nos deixar as mulheres bonitas para os homens sem imaginação" - Proust

     "Aos 40 anos, a mulher está longe de ser fria e insensível; mas ela sabe, quando necessário,
         cobrir o fogo com as cinzas" - Mary Wortley Montagu

    Literatura

    Poesia

     Temática Brasil: Miguel Torga (Portugal)

    Prosa

     Reflexões: Charles Melman

    Site de Leila Míccolis

     Cachorrada: foto de Luka, um cachorrinho superstar

     Abaixo-assinado para criação de hospitais veterinários públicos, assine e divulgue